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Próximo a um posto de combustíveis na rua Augusta, um dos locais de vida noturna mais agitada em São Paulo, quatro meninas ligeiramente embriagadas três delas com menos de 18 anos compartilhavam uma garrafa de bebida alcoólica. A tática para comprá-la, a mais usada: a mais velha vai até a loja de conveniência do posto e, sem qualquer suspeita, compra sua vodca para compartilhá-la com as amigas adolescentes, a poucos metros dali.
A cena nada incomum mostra que, apesar do reforço na fiscalização e na multa dos estabelecimentos no Estado de São Paulo que venderem álcool para adolescentes, os 500 agentes da Vigilância Sanitária Estadual e do Procon não devem alcançar sucesso absoluto. “Adolescente sempre dá um jeito”, conta uma delas, rindo.
Desde a 0h deste sábado, com apoio da Polícia Militar (PM), os agentes começaram a inspecionar bares, casas noturnas, lojas de conveniência e lanchonetes paulistas que vendem álcool, à procura de adolescentes. Nas primeiras seis horas, segundo a Secretaria de Saúde, 20 estabelecimentos foram multados: oito na capital, dois na região metropolitana e 10 no interior. E o valor da punição é o que mais chama a atenção: pode chegar a R$ 87,2 mil.
“Em vez de tomar conta de outros assuntos mais importantes, como educação e saúde, ficam querendo tirar dinheiro dos bares”, critica uma delas. “Acho a lei até certa, mas os donos dos bares não deviam levar a culpa se o adolescente falsifica RG ou consegue enganá-lo”, diz outra, ao que a mais velha completa: “só se tem 17 anos uma vez na vida, a gente não vai deixar de beber.”
Frentista de posto na região da Augusta há dois anos, V. S. confirma que muitos adolescentes realmente vão até a loja de conveniência para comprar álcool, frequentemente usando a tática das garotas. “Já aconteceu muitas vezes de vir o maior comprar álcool e a gente ver os menores esperando ali na esquina. Quando a gente percebe, não vende não”, diz. E se não perceber? “Daí precisa ver se vai ter fiscalização. A lei é boa, mas em geral só tem vigilância uns meses seguidos da lei, depois passa.”
Conscientização
As campanhas para conscientizar os donos de estabelecimentos começaram há um mês, e foram reforçadas na sexta-feira nas regiões de maior vida noturna. É o que mostra a gerente do Charm da Paulista, Rosineide Alves. Usando orgulhosamente um bottom da campanha, ela conta que os fiscais da campanha passaram no bar, deixaram um livreto, explicaram a nova legislação e o que o comerciante pode fazer. “Se achar que é menor, tem que pedir RG, e se o documento for suspeito, não vender de jeito nenhum. E se o cliente ‘engrossar’, é pra chamar a polícia”, enumera.
Não que já não fizessem isso. Vicente Vitoriano, gerente da Casa de Lanches Puppy, também na avenida Paulista, garante que em seus 30 anos trabalhando ali nunca vendeu, e nem vai vender, bebida a nenhum adolescente, mesmo que esteja acompanhado por adultos. “Se tiver um menor na mesa, a gente não serve ninguém”, diz ele. “Se tivermos dúvida, pedimos RG, e se não mostrar, não ganha nada. É simples.”
Mas nem sempre a situação vai chegar a essa consequência, explica Rosineide. “Quando a gente vê uma carinha de anjo, pede o RG com jeitinho. Quando o cliente se nega a mostrar, a gente já desconfia, e aí não serve”, diz. “E vai acontecer de perder o cliente? Vai. Mas se é pro bem de todos, vale, né?.”
Se não for por consciência própria, as pesadas punições dão conta de convencer qualquer dono de bar a recusar adolescentes. Além da multa de até R$ 87,2 mil para quem vender bebida a menores de idade, que dobra em caso de reincidência, o comerciante pode ter de fechar as portas por até 30 dias.
É o suficiente para alarmar o gerente do Ibotirama 2004, na rua Augusta. Já fechado por 30 dias por causa da Lei do Psiu, o bar teve um grande prejuízo que Bruno Moura Silva não pretende repetir. “É melhor perder o cliente do que levar uma multa dessa e ainda ficar fechado”, avalia.
Informado pelo Terra do valor máximo da multa já depois de ela começar a valer, o gerente do Charm da Augusta, Chagas Melo, reclamou da orientação dos fiscais. “Eles passaram aqui faz mais ou menos um mês, mas foi num horário muito cheio, não deu pra prestar muita atenção no que disseram. Eles deviam orientar mais”, cobra ele.
Apesar disso, Chagas conta que foi orientado a ajeitar a geladeira do bar eles costumavam deixar no mesmo freezer os refrigerantes e uma bebida de baixo teor alcoólico, o que é proibido. O principal da lei, assegura, eles já cumpriam. “A gente tem mesas ali embaixo (piso inferior) e vê um o menor chegar depois na mesa cheia, como se não quisesse nada. Daí a gente pede RG e até para de servir”, diz ele. “Quem garante que o menor não vai beber? Não vale o risco.”
Fonte: Terra