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Muitos transtornos psiquiátricos estão associados ao uso, abuso e dependência do álcool. Entre tais transtornos, destaco um dos problemas de saúde que mais tem chamado a atenção nos últimos anos: os transtornos alimentares.
Segundo a 4ª edição do Manual Diagnóstico Estatístico de Transtornos Mentais (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, DSM-IV), da Associação Americana de Psiquiatria, os transtornos alimentares são graves perturbações do comportamento alimentar, identificados especialmente entre as mulheres. Cerca de 0,5% a 3,0% da população feminina geral tem tal condição, mas uma porcentagem consideravelmente maior de mulheres apresenta comportamentos alimentares problemáticos e sub-clínicos. A sua etiopatogenia é desconhecida, porém acredita-se em um modelo causal multifatorial, com participação de componentes biológicos, genéticos, psicológicos, socioculturais e familiares.
Os tipos de transtornos alimentares mais conhecidos são a Anorexia Nervosa (AN) e Bulimia Nervosa (BN). A primeira caracteriza-se pela distorção na percepção do próprio corpo, com medo excessivo de engordar (mesmo estando abaixo do peso; IMC* menor que 17,5 kg/m2 ou menos de 85% do peso esperado), perda de peso autoinduzida pela privação de alimentos, negação da gravidade de perder peso e, finalmente, distúrbios hipofisários que podem causar amenorréia (ausência da menstruação) na mulher e, nos homens, perda de interesse e redução da potência sexual. Já a BN envolve episódios de perda de controle e ingestão excessiva de alimentos de forma compulsiva e periódica (duas vezes por semana, por no mínimo três meses consecutivos) e uso de métodos compensatórios, como atividade física exagerada ou uso de medicamentos purgativos, para atingir o peso abaixo do recomendado.
Alguns estudos mostram que pacientes com transtornos alimentares apresentam maior chance de consumir álcool com regularidade e de ter sensação de perda de controle sobre a quantidade e a frequência de uso. Em relação ao abuso e dependência de álcool, tais comportamentos são identificados entre 16% das pacientes com transtornos alimentares. Em uma análise sobre a ocorrência simultânea de problemas alimentares e transtornos relacionados ao uso de álcool, 38 estudos avaliados identificaram esse tipo de associação.
A importância do diagnóstico e tratamento adequado da coocorrência dos transtornos relacionados ao uso de álcool e alimentares é ainda mais relevante por dois aspectos: os transtornos alimentares são mais prevalentes entre mulheres jovens entre 18 e 24 anos e elas são mais vulneráveis aos efeitos das bebidas alcoólicas do que os homens.
No entanto, a relação entre os transtornos alimentares e aqueles relacionados ao uso de álcool está longe de ser de exclusividade das jovens. Uma pesquisa canadense analisou o risco de desenvolver tais condições ao mesmo tempo entre mulheres de diferentes faixas etárias (15-24; 25-44; superior a 44 anos), identificando essa associação em todas as idades investigadas, especialmente entre as mulheres com mais de 25 anos. Além disso, embora a junção das condições seja mais prevalente entre as mulheres, também tem sido identificada entre os homens.
Como a situação de uma doença adicional pode mudar a sintomatologia, interferir no diagnóstico, no tratamento e no prognóstico de condições psiquiátricas comórbidas, é muito importante que desde a primeira consulta de pacientes com suspeita de transtornos alimentares seja avaliado o uso de álcool, assim como de outras substâncias psicoativas. Detectá-los precocemente pode aumentar a adesão do paciente a um possível tratamento e seu sucesso, assim como a um bom prognóstico.
Fontes: Uol Minha Vida – Arthur Guerra
Ponce JC, Silveira CM, Andrade AG, Oliveira LG. Consumo de álcool comórbido a transtornos alimentares: uma revisão da literatura. Revista Saúde, Ética e Justiça, 2011 (in press)