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O uso nocivo de álcool resulta em 2,5 milhões de mortes por ano no mundo. Cerca de 320 mil jovens entre 15 e 29 anos de idade morrem de causas relacionadas a essa substância – o equivalente a 9% de todas as mortes nessa faixa etária. Tais estimativas, da Organização Mundial da Saúde (OMS), são preocupantes, tanto é que, em menos de uma semana, tivemos ao menos dois eventos importantes relacionados ao assunto.
Em setembro foi realizada uma reunião de alto nível da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre prevenção e controle de Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNTs), aberta pela presidente Dilma Rousseff. Nesse encontro (e na declaração política resultante dele), os principais fatores de risco em comum entre as DCNTs discutidas (doenças cardiovasculares, diabetes, câncer e enfermidades respiratórias crônicas), e evitáveis, foram: o sobrepeso e a obesidade resultantes da falta de uma alimentação saudável e da inatividade física, o tabagismo e o consumo nocivo de álcool.
Para diminuir o impacto deste último, ações e políticas públicas efetivas, baseadas em evidências científicas e adequadas ao contexto local, deveriam ser implementadas de maneira integrada por diferentes setores. Citou-se ainda o documento intitulado Estratégia Global para Redução do Uso Nocivo de Álcool, lançado pela OMS em 2010, que traz sugestões a serem aplicadas em todo o mundo – respeitadas, é claro, as diferenças culturais e socioeconômicas de cada país.
É nesse contexto de políticas públicas que se insere o segundo evento da semana: a Assembleia Legislativa aprovou o Projeto de Lei 698/2011, que proíbe, no Estado de São Paulo, a venda, a oferta, o fornecimento, a entrega e a permissão de consumo de bebida alcoólica, ainda que gratuitamente, aos menores de 18 anos de idade. Aqui, é importante apresentar o cenário do uso de álcool entre nossos jovens, baseado em pesquisas científicas recentes.
Um levantamento com estudantes do ensino médio em escolas particulares da cidade de São Paulo, realizado no ano passado, revelou que um em cada três estudantes entre 15 e 18 anos já havia bebido cinco ou mais doses de álcool em uma única ocasião, ao menos uma vez no mês anterior à pesquisa.
Quando analisamos o panorama brasileiro, nos deparamos com dados igualmente preocupantes. No 1º Levantamento Nacional sobre Uso de Álcool, Tabaco e Outras Drogas entre Universitários das 27 Capitais Brasileiras, que contou com mais de 12 mil estudantes, verificou-se que 79% dos entrevistados menores de 18 anos já tinham consumido algum tipo de bebida alcoólica. Além disso, estima-se que o primeiro consumo ocorra entre 13 e 15 anos de idade, considerando a população geral brasileira de adultos jovens (entre 18 e 25 anos).
Isso é um sério problema de saúde pública porque na adolescência o sistema nervoso central ainda se encontra em desenvolvimento e, portanto, mais suscetível aos efeitos do álcool. Nota-se, ainda, que o uso precoce de tal substância é um importante indicativo de maior risco para o desenvolvimento de transtornos relacionados (abuso ou dependência).
Como especialista em dependência química há 30 anos, tenho a clareza de que o uso nocivo e a dependência do álcool, por ser uma questão complexa e multifatorial, não é um problema que pode ser resolvido de maneira simples e rápida, como muitos de nós gostaríamos.
Abordá-lo sob uma visão interdisciplinar é essencial para lidarmos de maneira mais adequada com esse problema de saúde pública global. Ações integradas e complementares, baseadas em evidências científicas, sustentáveis e, principalmente, eficazes somente poderão ser desenvolvidas e implementadas se instituições de diferentes setores contribuírem junto à sociedade. Nesse aspecto, unem-se prevenção e tratamento. Além disso, não podemos deixar de lado o desenvolvimento educacional e social – disseminar amplamente o conhecimento adquirido por meio de pesquisas científicas deve ser prioritário.
Sim, ainda há solução para o uso nocivo de álcool. Ela envolve investir fortemente em programas de prevenção, inibir de forma intensiva o uso nocivo dessa substância e recuperar aqueles que dela já se tornaram dependentes.
Fonte: Arthur Guerra de Andrade – O Estado de São Paulo